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ESTADO LAICO, NO BRASIL, É UMA FALÁCIA!


A quilométrica e solenemente ignorada Constituição Brasileira apregoa, em seu artigo 5º, que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”; e, no artigo 19, que é vedado à União “estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público”.


Nas inúmeras armadilhas, que se fazem brechas-lacunas-crateras, de ordem linguístico-interpretativa, residem as incongruências. Por exemplo, o que seria essa “colaboração de interesse público”? Seria a senha para se estabelecer essa mistura da vida religiosa com a vida civil, desmontando o secular conceito (desculpem o trocadilho) de que o Brasil é um Estado laico?


Seria a tal “colaboração” essa flagrante contradição que obriga um país supostamente laico a venerar uma instituição eminentemente católica, consagrando o dia 12 de outubro como feriado nacional, quando outras religiões não a cultuam como tal, mas cujos seguidores são obrigados por lei a homenageá-la nesse dia? E os tantos outros feriados nacionais por serem “dias santos” católicos?


Não enxergo laicidade nisso. Penso que um Estado laico é aquele que tão-somente garante aos seus habitantes o espaço de livre crença e livre culto. Inclusive de não-crença. Na prática, não é assim, bem sabemos. Vem de séculos, e não amainou até hoje, a perseguição a religiões de matriz africana, ou a qualquer associação religiosa não-cristã. Ateus e agnósticos, então, são sumariamente rejeitados e tidos como anomalias.


O mais recente absurdo legal veio a lume através da sanção da Lei 13.796, de 03/01/2019, que, alterando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, garante, em nome da tal “liberdade de consciência e de crença” (caput do artigo 7ºA), a ausência do aluno da rotina escolar, motivada por preceitos de sua religião.


Ora, pensei que liberdade de crença fosse “o livre exercício dos cultos religiosos”, não a adaptação do cotidiano mundano aos ditames das religiões. E de algumas religiões cristãs, diga-se de passagem. Principalmente quando o tal artigo 19 da Constituição proíbe a manutenção de relação de dependência com doutrinas religiosas.


Nesse fuzuê dos infernos, dois detalhes chamam a atenção. O primeiro é que tal jurisdição não se aplica às escolas militares. Oi?! Por que será? É um gueto independente do restante do país? (É, sabemos, mas assumir-se isso em uma Lei é meio que demais!)


O outro detalhe é que essa excrecência jurídica foi chocada em ninho petista. O autor do projeto é o deputado Rubens Otoni, do PT de Goiás, e a relatora, na Comissão de Constituição e Justiça, foi a festejada deputada Maria do Rosário, do PT do Rio Grande do Sul. A cereja do bolo: foi aprovado em caráter conclusivo, portanto sem sequer ir a plenário, para discussão. Caiu como verdadeiro presente, no colo do presidente da República, que, sem precisar ser responsabilizado pela sua confecção, pode, assim, afagar os religiosos que o apoiaram, e que andam meio ressabiados com algumas atitudes suas, que desagradaram à laia eclesiástica.


No frigir dos ovos, esse artigo-remendo da LDB, além de mexer no protocolo das instituições escolares, que precisam se colocar à disposição das doutrinas religiosas, termina retirando a maturidade das escolhas religiosas, banalizando ainda mais os comportamentos dos “fieis”, que podem, assim, fazer suas opções de fé, tranquilos de que não terão consequências contrárias, no ímpio processo mundano de que também fazem parte. Não precisarão pagar o ônus de suas alternativas. Fazer escolha assim é muito bom! Ganha-se de todos os lados, sonegando o princípio básico da escolha, que é a renúncia a uma das opções.


Desta forma, pode-se calçar a luva sem tirar o anel, subir nos ares e ficar no chão, guardar o dinheiro e comprar o doce, brincar e estudar... em suma, estar em dois lugares ao mesmo tempo. Eu, por mim, fico com a sóbria poesia de Cecília Meireles, aliás tida como infantil...



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